18 de nov. de 2015

Casal de babalorixá e evangélica dá lição de tolerância religiosa

Sandro e Márcia estão juntos há vinte anos. Casaram no civil e tiveram três filhos. Dia desses, o filho mais velho do casal, com 16 anos, fotografou os pais um ao lado do outro. Sandro gostou do resultado. Pegou as imagens e divulgou nas redes sociais. Rapidamente, a postagem ganhou repercussão. As fotos tocam em um ponto polêmico em qualquer parte do mundo: a religião. Ele, babalorixá, e ela, evangélica. Ambos negros, defendem a convivência pacífica e respeitosa entre pessoas de crenças diferentes. São uma exceção à regra. Um exemplo de sabedoria.


O casal mora em um terreiro de candomblé e jurema, no bairro do Ibura de Baixo, no Recife, mantido por Sandro dos Santos Lima, 43, mais conhecido como Sandro de Jucá. Nos dias de toque, Márcia Justino da Silva Lima, 37, conta receber com prazer os adeptos da religião do marido. “Nunca senti rejeição, apesar de já ter ouvido comentários maldosos. Para mim, o demônio existe no coração e na cabeça de cada um e não na religião. Ele está na violência, no preconceito, quando a gente trata mal o próximo, não ama o semelhante”, reflete Márcia, seguidora da Igreja Batista Remidos do Senhor.

Sandro já foi às festas da igreja frequentada pela companheira e, além disso, leva Márcia para o culto. “Já cheguei a notar alguns olhares, mas precisamos entender que a diferença é que nos une. Juntos, somos fortes. Os pastores têm que ter consciência de que nossa liturgia é diferente da deles, acabar o preconceito. Podemos viver bem. Eu com meu ‘saravá’ e ela com o ‘aleluia’”, pontua.

Na avaliação de Sérgio Douets, professor do doutorado em ciências da religião da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), os maiores grupos fundamentalistas do mundo hoje pertencem a três religiões monoteístas. “Tem o monoteísmo judaico, a situação complexa no mundo islâmico e o cristianismo, seja ele católico ou evangélico.

Juntas, têm o mesmo pai na fé, que é Abraão. No Brasil, há católicos conservadores que criticam o papa Francisco por conta das reformas, do diálogo entre as religiões. Já o neopentecostalismo de matriz evangélica, surgido nos últimos trinta anos, enfatiza, além do Espírito Santo e da cura, a prosperidade, sinal de bênção de Deus. Esses últimos são os mais agressivos na intolerância frente às outras religiões”, raciocina.

Diante de ações impetradas no Ministério Público de Pernambuco (MPPE), alguns radicais têm limitado os discursos de intolerância apenas aos cultos. “A questão é que eles se apropriam de símbolos de religiões de matrizes africanas e vendem em nome de Jesus, como o branco do pastor. Para o professor, é preciso  buscar a interreligiosidade.

Grupos de defesa das religiões de matriz afro-indígena não sabem dizer quantos terreiros foram destruídos nos últimos anos por causa da intolerância religiosa. "A intolerância religiosa destrói muito mais a auto-estima dos sacerdotes e sacerdotisas. Alguns abandonam a religião por causa do racismo e das condições sociais dos terreiros. Nesse sentido, o patrimônio imaterial dos terreiros é o mais atingido”, afirma Alexandre L’Omi Lodò, do Quilombo Cultural Malunguinho.



Fonte. Marcionila Teixeira - Diário de Pernambuco
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